Não chore…
Algum tempo depois do episódio em Cafarnaum com o centurião romano, aquele que demonstrara extraordinária fé, Jesus foi para a Aldeia da Consolação [em hebr.: “Naim” — localizada a menos de 10 Km do Monte Tabor, onde se supõe ter ocorrido a Transfiguração do Senhor]. Como já era de hábito, seus discípulos iam com ele, acompanhados em cortejo por ruidosa e animada multidão.
Quando se aproximavam do portão, à entrada da cidade, cruzaram com outro cortejo. Estes, ao contrário, vinham pesarosos e desolados, pois pranteavam a morte do filho único de uma viúva. Ela era muito estimada, por certo, pois muita gente da aldeia acompanhava o enterro.
Ao se dar conta do que se passava, Jesus comoveu-se e padeceu com aquela mulher a sua dor. E tentou consolá-la, dizendo: — Não chore!
Mais que isso, sem que ninguém lhe pedisse nada, Jesus chegou perto e tocou a mortalha onde era levado o corpo do rapaz, sem se importar que o considerassem impuro por ter feito isso. Nisto, os que o estavam carregando pararam.
Jesus, então, disse: — Jovem, eu ordeno, levante-se!
O que supunham estar morto se sentou e começou a conversar. E desta forma Jesus o restituiu à sua mãe.
Os que testemunharam este acontecimento ficaram possuídos de sentimentos contraditórios de assombro e admiração, e diziam: — Que grande profeta Deus nos enviou! Finalmente ele veio salvar o seu povo!
Essas e outras boas notícias a respeito de Jesus se espalharam por toda a província da Judeia, bem como pelas regiões circunvizinhas. (Lucas 7.11-17)
Neste episódio, o da ressurreição do filho da viúva de Naim, diferente do caso do centurião, não há pedidos de amigos importantes, insistindo para que Jesus venha em socorro de alguém ainda mais importante. Desta vez trata-se de pessoa desimportante.
Se pudéssemos vê-la, logo saberíamos tratar-se de uma viúva, pela simples observação de sua maneira de trajar: despojada de ornamentos, vestindo-se de pano de saco, cobrindo a cabeça com um manto, despenteada e com o rosto sujo… pois não eram concedidas às viúvas quaisquer vaidades higiênicas ou estéticas (cf. Gn 38.14-19 e Jt 10.3-4 e 16.8).
Sabemos também, pela narrativa, que o que aí vai, envolto na mortalha, carregado por quatro homens sobre a padiola, é o único filho, ainda adolescente (gr.: “Neaniskos”), daquela que mais chora.
Tal choro é plenamente justificável: perder um filho para a morte já é em si dor indizível, neste caso, agravada por ser filho único, e a mãe, viúva. A morte do filho significava a perda inclusive do meio de sustento, de sobrevivência, da mulher.
Em sociedades machistas, viúvas e órfãos padecem terrivelmente. Por essa mesma razão, o Deus de Israel lhes dedica especial cuidado: Pai dos órfãos, justiceiro das viúvas, tal é Deus em sua morada santa; o SENHOR guarda o peregrino, ampara o órfão e a viúva, assim cantavam os israelitas nos salmos (vd. Sl 68.6 e 146.9).
Aos que têm prestígio, poder e riquezas, dificilmente faltam quem por eles intercedam. Mas quem há de importar-se com os excluídos, com os desprezados, com os despossuídos? Para vir em socorro desses, o Deus de Jesus Cristo não depende nem de intercessores, nem de súplicas, nem de demonstrarem aqueles extraordinária fé.
Neste encontro evangélico, Jesus se adianta a qualquer pedido ou intercessão, e, sem exigir fé, realiza o milagre.
Sim, Jesus é filho do mesmo Deus revelado no Primeiro Testamento: Pai dos órfãos e justiceiro das viúvas.
Ensina-nos, aqui, Jesus, que casos há que requerem mais que oração: estas são lágrimas que, para serem enxugadas, precisam, antes, da nossa AÇÃO.
Reverendo Luiz Carlos Ramos†
(Para o Terceiro Domingo após Pentecostes, Ano C, 2016)
Uma outra abordagem possível. Tão lida quanto silenciada por muitos seguidores.
Valeu meu amado irmão Luiz, grato pelo bom pão.
Querido Lindberg, repartir com você o Pão e a Palavra faz de mim um privilegiado.
Abraço.